terça-feira, 23 de novembro de 2010

Como diferenciar a coral verdadeira da falsa?

Um dos maiores mitos da Herpetologia (ramo da zoologia que estuda répteis e anfíbios) é que se pode diferenciar uma coral verdadeira de uma falsa por meio da sequência de cores de seus anéis. Essa lenda é tão difundida (e defendida veementemente por leigos) que confesso que eu mesmo fui iludido pela regra abaixo, no início do meu interesse pelo assunto:


"Red touches yellow, you're a dead fellow. Red touches black, you're alright Jack."


Cobra do Leite - Lampropeltis triangulum
O verso que basicamente significa "vermelho com amarelo, você está morto e vermelho com preto, você está bem" é - mesmo que bem intencionado - limitado e específico. Esse verso é ensinado às crianças em algumas regiões nos Estados Unidos com o intuito de capacitá-las a distinguir a espécie Coral Verdadeira (Micrurus Corallinus) da inofensiva Cobra do Leite (Lampropeltis triangulum). Se determinada região contiver apenas essas duas espécies (desconsiderando inclusive as possíveis subespécies) a regra torna-se, podemos dizer, circunstancialmente válida. O que acontece é que a realidade da fauna brasileira é bastante diferente.
  

Apenas para se ter ideia, no Brasil existem dezenove espécies catalogadas de cobras corais verdadeiras (pertencentes ao gênero Micrurus, dotadas de veneno neurotóxico).  Usando como exemplo apenas uma delas, a espécie Cobra Coral (Micrurus Frontalis) possui a sequência de cores considerada inofensiva pelos mais ingênuos (vermelho com preto), mas é tão letal quanto as demais espécies e subespécies de seu gênero.
  

Coral Verdadeira - Micrurus Corallinus

Cobra Coral - Micrurus Frontalis













Considerando apenas três fatores, o mito dos padrões de cor é prontamente derrubado :

  1. As espécies catalogadas de corais verdadeiras não possuem os mesmos padrões de cor e várias delas possuem a sequência 'vermelho com preto';
  2. Como as falsas corais confundem seus predadores por imitar o comportamento e o padrão de cores das verdadeiras, tendem a ser extremamente parecidas;
  3. O potencial genético desses animais permite o surgimento de novas espécies e subespécies, ou seja, mesmo considerando todo o catálogo de serpentes, ainda existe o que desconhecemos.
Até o momento, vimos que diferenciá-las pela sequência de cores é uma técnica terminantemente ineficaz e perigosa, afinal, as corais são as cobras mais venenosas do território brasileiro, podendo matar um homem adulto em poucas horas. Dado tudo isso, qual é a maneira correta de se identificar uma coral verdadeira?

A resposta está nos dentes.  As corais verdadeiras (assim como todas as serpentes da família Elapidae, á qual também pertence a famosa Naja) possuem dentição proteróglifa, ou seja, são dotadas de pequenos e fortes dentes não retráteis, localizados na parte frontal do maxilar superior. Com isso, a coral não pica seus oponentes como fazem as serpentes da família Viperidae (Jararacas e Cascavéis, p.e.), mas os morde deixando a peçonha escorrer para dentro da incisão. As falsas corais possuem, por sua vez, dentição opistóglifa, o que significa que suas presas ficam na parte de trás do maxilar posterior, apresentando assim perigo altamente reduzido para o homem.


Dentição Opistóglifa (como a das falsas corais)


Dentição Proteróglifa (como a das corais verdadeiras)

Os especialistas são unânimes em afirmar que é muito difícil perceber a diferença entre a espécie verdadeira e a falsa, portanto, não se aventure em solo desconhecido.

Ainda não está convencido de que a regra das cores não é confiável? Confira a matéria "Falsa coral consegue imitar cores de seis cobras diferentes" da Globo Amazônia clicando no link.

Até o próximo post!

10 comentários:

  1. Muito boa essa matéria. O negócio é não chegar perto de nenhuma coral, seja ela verdadeira ou falsa, pois não vale a pena esperar ela abrir a boca para distinguir uma da outra...rs

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  2. Não mande isso pro irmão Pedro, por favor!

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  3. Engraçado,esta matéria me lembrou um trabalho que fiz sobre serpentes no ginásio. Um primo que desenha muito bem ficou responsável pelas figuras. Tive um trabalho enorme para pesquisar pq não tinha internet na época. MOMENTO NOSTALGIA. Muito boa matéria. Parabens.

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  4. Mto boa a matéria! esse final de semana minha cachorra foi morta por uma filhote de coral em jaraguá do sul sc, e já vi algumas por lá, estava pesquisando e realmente o método que mais vi para diferenciá-las é a cor, estava crente nisso até ler sua matéria e me convencer o contrário, a final tem muitas dessas na chácara do meu pai além das jararacas e não quero correr riscos

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  5. Este comentário foi removido pelo autor.

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  6. https://www.facebook.com/photo.php?fbid=188188561535743&set=a.139404366414163.1073741828.100010338018322&type=3&theater

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  7. Sou médico neurologista. Apliquei horas de leituras, via internet, esmiuçando essa questão da diferenciação da verdadeira e falsa corais pelos anéis. Neste blog me convenci: as regrinhas das cores são falsas; e a da dentição obriga-nos a matar a cobra, que pode ser falsa coral. O mais recomendável é corrermos para a unidade de saúde (levando a cobra morta?). Mas pouquíssimos postos ou hospitais, no Brasil, dispõem dos soros antiofídicos!

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  8. terminei de ver o Bear Grills no discovery aplicando a regrinha das cores e segurando na mao uma coral, isso Everglades.....levou sorte... mas aprendi e vi as fotos...o melhor e sair do habitat delas.

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  9. Boa explicação mas não ficarei esperando para ver a dentição da cobra para saber se é falsa ou não. A primeira vista tem como diferenciá-las? Isso é importante pra leigos como eu. Abraço.

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